Gio ajeitou os óculos, respirou fundo e posicionou sua bolsa que poderia muito bem ser um cinto de utilidades. Desta vez estava mais calma e centrada. Deveria agradecer a Nina por não a deixar voltar na noite anterior. Virou-se para a irmã e mostrou o celular com a bateria cheia. Nina riu e a abraçou em silêncio.
— Estou pronta.
— É bom me levar pra ver esse lugar uma hora dessas.
— Sim. Vou te mostrar. Eu só preciso... — olhou para ela e apertou os lábios. A fila de coisas a descobrir parecia bem maior agora que antes.
— Pelo menos me avise se chegou bem. Certo?
— Certo. — Afastou-se um pouco. — Aprendi um novo truque. — Fez um gesto com as mãos, desaparecendo no ar em uma distorção em espiral ao redor dela. Nina olhou aquilo surpresa.
— Parece prático, mas as passagens eram mais legais. — Sentou na cama da irmã e passou a mão na colcha num ritual silencioso. Pegou o celular no bolso e olhou a bateria. Em algum momento Gio mandaria uma mensagem e ela estaria ali para ler.
Voltou para a fortaleza de Elzevir e ali parecia ser dia também. Havia aprendido que poderia usar o Gnósis do Grimoire de Poliphilo guardado em sua memória para ir onde quisesse, pois ainda não havia tentado usar sua própria Gnósis diretamente. Tudo estava indo depressa e ela não tinha tempo para se concentrar em tantas variáveis. Olhou o celular e digitou uma mensagem para deixar Nina mais tranquila. Depois olhou ao redor para procurar por seu anfitrião. Não estava a vista. Onde poderia estar num lugar tão imenso? Pensou no truque que o próprio criador lhe ensinara e caminhou para uma porta aleatória, na certeza de que entraria na sala onde Elzevir estava, mas qual não foi sua surpresa ao dar na Fortaleza dos Esquecidos.
Seus olhos tiveram de se acostumar ao contraste entre o lugar que estivera e o ambiente de luminosidade fria que a recebia agora. Mal notou a porta fechar-se atrás e desaparecer. Então ela podia seguir um biblios só pensando nele? Era uma característica da Fortaleza do Domo ou agora era um poder seu? E se pensasse em Poliphilo? Iria até onde estivesse? Seria prudente?
— Não. Preciso achar Elzevir primeiro. — Retomou seu foco. — Mas o que ele está fazendo aqui? — Lhe ocorreu que talvez Elzevir estivesse com Poliphilo e, por fim, decidiu procurá-los do modo tradicional. Talvez fosse mais seguro.
Caminhou novamente entre os corredores de altas prateleiras com muitos livros Sumidouros cujas correntes tilintavam ocasionalmente quando ela se aproximava. Lembrou-se de manter uma distância segura, pois não queria ser surpreendida como fora da outra vez. Ao mesmo tempo sentia a enorme curiosidade de tocar aqueles livros. Por um segundo lembrou-se das palavras de Nômade,“Os vazios cumpriram sua função” e aquilo lhe deu uma nova luz. Se os vazios já haviam cumprido sua função, talvez fossem inofensivos agora e só a Gnósis restante estivesse esperando em seu interior. Poliphilo poderia detectar isso, sem perceber que o que estava detectando era um Gnósis mais profundo, aquele que o Gnóstis pode ler. Mesmo que não pudesse ler um Gnósis daquele como ela fazia com os Grimoires ou ver com clareza quantas “vozes” havia dentro de um Sumidouro ainda ativo, podia sentir o sopro interior de um que aparentemente estava vazio, sem se dar conta da importância daquilo. A questão é que só havia um meio de confirmar isso; tocando um Sumidouro aparentemente vazio.
Sabia que era arriscado? Sim. Sabia que poderia ter problemas? Talvez, mas quando fechou seus olhos teve o pressentimento de que deveria fazê-lo. Provavelmente por ter despertado mais sua própria Gnósis, agora lhe parecia que podia ver aquele lugar de um ponto de vista diferente. Não eram mais livros de aspecto decrépito e vazios como cascas: talvez fossem conchas escondendo pérolas.
Nesse minuto olhou para a grandiosa abóbada enredada em arabescos de metal negro e imaginou que aquela arquitetura de gaiola talvez estivesse a guardar pássaros vivos ainda, não apenas cadáveres ou moribundos. A luz insistia em entrar lá e ela olhou para os antigos livros acorrentados. Suas mãos voltaram a deslizar próximas as correntes e desta vez o tilintar parecia um chilrear metálico como se ela tivesse descoberto um segredo que animou a própria Fortaleza do Esquecidos. Pensou que as fortalezas tinham sua própria Gnósis e assim como esta criara poderes únicos de impedir rastreios, talvez ela também torcesse para que seus protegidos pudessem falar mais uma vez.
Se eu tirar um dos livros das correntes ele vai sumir para o local onde foi achado ou eu tenho o poder de mantê-lo comigo?
Mordeu o lábio enquanto lutava com aquela dúvida e, por fim, sua mão tocou cuidadosamente uma capa decrépita e negra. A corrente vibrou num chilreado e acabou por baixar o tom como se agora a reconhecesse. A sensação era de couro gasto, mas parecia haver um leve toque aveludado, não hostil, nem grosseiro como o pelo de um cão idoso que ainda é macio ao toque depois de tanto viver. O Sumidouro parecia realmente ter perdido sua carga inicial que poderia produzir danos, ou ela era imune ao pouco que porventura pudesse existir. Fechou os olhos e, no início, sentiu a casca vazia, mas depois veio um eco de um passado longínquo. Aleatoriamente escolhera um livro e percebeu que este fora feito há muito tempo.
Sua mão segurou o livro pela lombada com mais firmeza e ficou surpresa ao perceber que apesar de ser razoavelmente grande, era muito leve. Estava deitado na prateleira como os outros e a corrente que se prendia na ponta dele continuava chilreando como se agora quisesse falar. Gio sorriu um pouco para ela.
— Pode soltar agora. Eu estou aqui. Já fez sua parte. — falou aquilo com tanta espontaneidade que surpreendeu a si mesma, mas ficou mais surpresa ao ver que sua sugestão foi atendida. A corrente soltou-se delicadamente e deslizou, ficando pendurada na estante, sem função. O som que emitia também parou e agora ela olhava para o livro que parecia estar ali apenas pelo fato dela o manter seguro em sua mão.
Tudo parecia bem até agora. Concentrou-se um pouco no antigo eco e, num primeiro momento, não parecia haver muito. Talvez devesse abri-lo. Estava nesse impasse quando um inesperado som saiu de seu interior, como algo preso que escapou depois de tanto tempo.
Um guincho arrepiante inundou o recinto e sumiu fazendo os pelos do braço de Gio se eriçarem, ao mesmo tempo em que dava um leve salto para trás. Pensou em soltar o livro, mas teve receio de perdê-lo. Aquele som horrível não vinha do livro, mas era de algo e ficara retido ali. Fazia parte do eco do passado como uma caixa velha que se abre e deixa escapar um cheiro embolorado. Seu coração ainda estava aos pulos com aquele som e tentava acalmar sua respiração. Se houvesse mais alguém ali, poderia muito bem ter ouvido aquele estranho som. Ensaiou para remover o livro da prateleira com cuidado. Sua ideia agora era não sair dali sem ele. Havia mais para tentar ler.
— Quem é você? — Aquela pergunta a assustou mais do que o guincho, quase derrubando o Sumidouro da prateleira. A adrenalina que fora injetada em seu sangue agitou-se com a nova interferência. Gio virou o rosto, mas manteve a mão na estante numa posição um tanto desajeitada para confirmar o que já sabia. Aquela voz era de uma estranha.
Diante dela, no extremo do corredor de estantes, estava uma jovem absurdamente alva.Pensou que se fosse humana seria albina, mas seu Gnósis era bem evidente. A luz que entrava pelos vitrais parecia sentir-se atraída por aquela figura. Os cabelos extremamente curtos, com uma franja cortada reta e perfeita, eram igualmente brancos como a pele, mas possuíam um reflexo prateado tão incomum que fez Gio lembrar-se do ouro nos olhos de Poliphilo. Ali havia prata em sua composição, bela prata de alguma iluminura, talvez. Os olhos eram de um lilás surreal que também possuíam um brilho argênteo. Usava trajes brancos tão delicados, com detalhes de finos bordados negros, como se envolta em véus de seda numa saia curta na frente que deixava à mostra os pequenos pés revestidos por botinas igualmente brancas. No entanto, tudo que a fazia parecer diáfana não combinava com a expressão congelada, como uma boneca de porcelana que nunca sorria. Foi então que percebeu que não tinha sobrancelhas, ou eram tão finas e brancas que faziam seu rosto ficar mais inexpressivo.
— Quem é você? - ela repetiu a pergunta sem se mover. O tom de voz era frio e contido, mas não exatamente hostil. Antes parecia querer emanar uma força como se tentasse fazer-se autoritária.
— Eu… — Gio finalmente ouviu sua voz ecoando naquele lugar. Com certeza era bem pior que sua interlocutora em parecer confiante. — … sou um biblios como você, claro! — Contou com sua Gnósis para fraudar a identidade, mas sentiu-se uma menor mentindo a idade.
— Não conheço você.
— Sou nova. Recém-nascida, praticamente! - Repreendeu-se mentalmente por sua piada horrenda.
— Como entrou aqui? — A jovem deu um pequeno passo para frente olhando-a com mais atenção. Gio lembrou-se que estava segurando o Sumidouro e respirou fundo já imaginando que aquilo não passaria despercebido.
— Convidada? — Arriscou fortalecer a mentira.
— Só o Alfarrabista dos Mortos pode permitir sua entrada aqui. Quando ele fez isso? — seus olhos se estreitaram e agora pareciam efetivamente mais hostis.
— Recentemente… ? — A estranha deu mais um passo em sua direção enquanto ela ia rumo ao poço da lorota vexatória.
— Então sabe por onde ele anda? — Seu olhar parou nas mãos de Gio e os olhos que focavam nela se abriram com surpresa ao recair finalmente no Sumidouro. — Você está segurando um Sumidouro sem as correntes!? Como fez isso!?
Que droga!
Gio finalmente puxou o Sumidouro junto ao corpo, bem seguro com as duas mãos.
— Su Won! Venha aqui! — A estranha falou com uma potência que Gio nunca imaginou que tivesse
Malditos poderes mirabolantes!
Aproveitou a fração de segundo em que sua interlocutora virara o rosto para chamar o guardião e disparou numa corrida louca, arremetendo-se entre um corredor paralelo numa tentativa de poder fugir pela biblioteca.
Bem que minha mãe diz que mentira tem pernas curtas!
Correu seguida apenas pelo eco de seus passos e praguejou mentalmente com seu nervosismo. Precisava sair dali. Ziguezagueou distanciando-se entre o labirinto solitário de livros e parou apenas para ouvir passos que não vinham. Não parecia estar sendo seguida, ou talvez não precisassem. Olhou para o Sumidouro junto ao corpo e ele permanecia quieto, como um filhote sendo abrigado nos braços de alguém. Precisava levá-lo, sair dali, e não sabia se Elzevir ainda estava lá.
Ergueu a mão num gesto para invocar a Gnósis, mas parou surpresa ao ver a névoa fria sobre seus pés. Agora todo o piso da biblioteca parecia revestido dele. Lembrou-se que Su Won podia parar o tempo mais que os outros biblios e entendeu o que estava acontecendo.
Uma armadilha! Está tentando me reter! Surpresa! Você não vai conseguir!
Com um movimento de mãos um pequeno tornado a levou dali.
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As botas negras ecoavam suavemente e faziam a névoa afastar-se ao seu redor segundo sua vontade. Su Won parou olhando ao redor e sentiu novamente aquela Gnósis. Era a mesma pessoa que estivera da outra vez, tinha certeza. Para a maioria dos biblios pareceria uma Gnósis como as outras, mas ele, assim como os outros do Conselho, poderia sentir a sútil diferença ali; uma Gnósis potencialmente poderosa, mas desta vez também misturada a uma já muito peculiar: a Gnósis de Poliphilo. Com certeza esse indivíduo estava guardando o Grimoire dele e o usara agora, embora, mais uma vez não pudesse rastreá-lo por causa da fortaleza. Usar o Grimoire dele significava algo incomum. Nenhum biblios poderia usar o Grimoire de outro. No entanto, apesar de deter um poder que a fazia estar imune a sua suspensão de tempo, parecia não estar seguro ainda de usar seu próprio Gnósis para se transportar sem uma passagem. Da outra vez com certeza fora capaz de abrir um portal.
“Alguém que ainda não domina toda sua habilidade ou não tem percepção de tudo que pode fazer.”
Bateu de leve no chão com a ponta da guarda de sua espada, fazendo toda névoa sumir.
— Curioso — comentou com uma expressão pensativa.
Os passos da delicada jovem ecoaram atrás dele.
— A pegou?
— Fugiu.
— A névoa não a reteve? — aquilo pareceu surpreendê-la ainda mais.
— Você a viu. Como era? — falou sem se virar.
— Era… muito… comum. — Pensou no seu pequeno encontro. — Não havia nada peculiar nela. Parecia uma garota comum. Como uma humana, eu diria, mas com certeza era um biblios, pois senti sua Gnósis. — Su Won estreitou os olhos com um pensamento que considerou impossível, naquele momento. A jovem continuou. — Mas o que me surpreendeu foi que ela estava segurando um Sumidouro! Ela o soltou da corrente e o levou consigo.
Su Won moveu o rosto por sobre o ombro e finalmente encarou-a. Sua expressão revelava uma surpresa que não desejava expor.
— Ela levou um Sumidouro, você disse?
— Sim. Ela conseguiu levar.
Ele permaneceu em silêncio e fez um gesto para abrir uma passagem e sair dali.
— Vamos! Está na hora de fazer algumas consultas. — Seguiu em frente com a delicada biblios em seu encalço.
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Giovanna pensou que voltaria para a Fortaleza do Domo, mas acabou por parecer onde estivera antes com Poliphilo, o recinto dentro da Fortaleza dos Esquecidos. Piscou os olhos para ver os grandes vitrais brancos que deixavam luz abundante entrar ali e sentiu uma mão puxar seu braço repentinamente. Ele estava ali diante dela, segurando-a de frente e observando surpreso o livro que ela aninhava com cuidado. Com certeza acabou por ser atraída por Poliphilo. Seus pensamentos a traíram e fizeram ir até ele, tinha de admitir.
— Que faz aqui? Não deveria estar na fortaleza. — Seu tom era mais de preocupação que de repreensão.
— Vim atrás de Elzevir. Ele esteve aqui?
— Ele já voltou… — Continuou a olhar o livro. — Como fez isso?
— Eu apenas fiz. Está tudo bem. Ele está seguro comigo. Poli, eu acho que posso lê-lo também — confessou esperançosa.
O olhar de Poliphilo pairava em seu rosto num misto de preocupação e orgulho. Sorriu um pouco ao ouvir o modo como ela o chamou. Podia sentir o Gnósis dela começando a despertar num crescente. Ganhava um ritmo impressionante e, por um lado, isso era bom, mas receava que se arriscasse à toa.
Gio também o observou. Havia uma leve transparência em sua pele que a preocupou. Era como quando ele se mostrara para provar quem era, mas agora parecia estar acontecendo independentemente dele. Sútil, mas começava a ser visível. A ideia de Poliphilo sumir a apavorou por um segundo, contudo quis manter-se firme. Nômade lhe dissera que não havia tanto tempo e ela precisava de cada segundo para ajudá-lo.
— Poli, eu vi Nômade. Falei com ele! - Revelar aquela informação fez Poliphilo segurar sua mão de forma afetuosa e pousar a outra sobre o livro que ela segurava.
— Eu fico tão feliz em saber que seu poder chegou nesse ponto. Imaginei que poderia fazer isso, mas nunca tão depressa. Agora você deve levar este livro e encontrar Elzevir. Precisa…
— ...falar com Elzevir. — ela completou a frase como se ouvisse Nômade diante de si. — Nômade me disse o mesmo. Você não vem? Você… não parece bem. - Se atreveu finalmente a verbalizar sua preocupação.
— Eu vou ficar bem. Não precisa de mim para o que vem a seguir. Apenas guarde meu Grimoire e só o devolva a mim, quando eu pedir. — Sorriu com aquele ar confiante para dar coragem a ela. — Quando for para a Fortaleza do Domo, não entre pela nave central. Vai entender quando chegar lá. Agora vá! Eu estou seguro aqui. — Sua mão ainda reteve a dela por alguns segundos e Gio ficou surpresa em perceber o quanto aquele toque poderia ser caloroso. Era como se Poliphilo estivesse tentando deixar seu Gnósis passar com aquele único gesto. Ela sorriu e soltou a mão devagar, afastando-se um pouco.
— Estou indo. Eu volto! — prometeu e fez um gesto para finalmente desaparecer.
Poliphilo ficou olhando o vazio e sentiu como se finalmente pudesse soltar a respiração após sentir o Gnósis da jovem artesã se desvanecer. Sentou-se lentamente.
— Ela está tomando suas próprias decisões agora. Seu poder a guiará como um farol. Tenho certeza, Salomon. — Olhou para um canto do recinto de onde Salomon surgiu. Estivera parado atrás de grande biombo branco, ricamente entalhado com miríades de padrões geométricos e florais, a observar ambos. Gio estava tão focada em Poliphilo que não chegara a sentir sua presença, já ele a sentira, assim como Poliphilo e Elzevir, no momento em que chegou à fortaleza, mas era impossível ir ao seu encontro com Su Won ali em sua vigília constante. Embora não fosse capaz de deter a jovem Gnóstis, não era um encontro inicialmente desejado. Havia muito para explicar a ela, contudo a própria jovem parecia seguir sua trilha com seu poder. Ver Nômade era um sinal inegável que ela estava mais perto de ajudar os necromons como nenhum outro biblios esteve, por mais poderoso que fosse.
Elzevir já sabia que Su Won não deixaria um segundo encontro passar despercebido, pois estava ciente do poder do guardião de detectar os níveis de Gnósis e assim precisava se adiantar ao seu futuro interlocutor, voltando para a fortaleza e deixando Salomon para uma tarefa mais delicada.
O pequeno biblios estivera criando um novo Grimoire por dias seguidos. Era uma tarefa cuidadosa e demandava muita energia, mas ele estava tão disposto que Poliphilo não teve coragem de dissuadi-lo. Agora segurava o delicado livro que brilhava com suas dezenas de detalhes coloridos e pulsava como um pequeno ser recém-nascido. Finalmente atingira seu auge e estava formado. Aproximou-se do alfarrabista e mostrou sua pequena obra. Poli sorriu um pouco e passou os dedos na delicada capa. Sua pele tornou-se menos transparente assim que parou sobre ela.
— Salomon… isso lhe custou muito. Não é realmente necessário. — Seus olhos pareciam mais escuros e o brilho dourado permanecia oculto. O outro moveu a cabeça em negativa e erguendo uma das pequenas mãos revestidas de delicado tecido colorido colocou-a no peito do amigo.
— Voc… val… muith — balbuciou com dificuldade.
Poliphilo o fitou um momento e tocou sua cabeça igualmente coberta, puxando-o com cuidado para perto de si, num abraço gentil.
— Você vale todos os meus dias, pequeno Salomon. Você é um milagre. Obrigado por estar aqui. - Fechou os olhos.
Salomon afastou-se um pouco e encostou o pequeno Grimoire sobre o peito de Poliphilo. Aos poucos aquele objeto foi se desvanecendo em energia e entrando no corpo do alfarrabista. À medida que aquilo acontecia, as cores voltavam ao rosto dele, junto com o brilho dourado de seus olhos e a textura íntegra de sua pele. Em segundos o pequeno livro já fazia parte de Poliphilo e ele sentia-se mais forte. Quanto tempo? Não sabia. Mas esperava ser o suficiente para ajudar Giovanna em sua tarefa.
— Obrigado. Sou grato por seu tempo e energia gastos, Salomon. — Colocou sua cartola e olhou para o horizonte que os vitrais exibiam. — Vamos fazer valer a pena. — Seu costumeiro charme abriu-se num sorriso.
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